A resistência ao cloreto estanoso (SnCl2) nas células eucarióticas de
levedura Saccharomyces cerevisiae é um produto de vários processos
metabólicos. O mutante rad52 , deficiente no mecanismo de reparação
recombinacional, incapaz de reparar quebras simples e duplas no DNA, foi
o mais sensível ao íon metálico Sn²+. A resistência relativa dos
mutantes rad e rad4 , deficientes na reparação por excisão de
nucleotídeos (NER), mostrou-se significativamente elevada, indicando a
participação dessa via na reparação dos danos causados pelo SnCl2. Uma
série de mutantes defectivos na via de reparação por excisão de bases
(BER), combinada com mutantes defectivos em NER, foi utilizada para
determinar indiretamente o tipo de lesão causada pelo SnCl2 ao DNA. A
DNA N-glicosilase (Ntg2p) mostrou-se, por sua vez, indispensável à
reparação das lesões ao DNA induzidas pelo íon metálico Sn²+. A ausência
do fator de transcrição Yap1, responsável pela resposta ao estresse
oxidativo em leveduras, ocasionou o aumento da sensibilidade ao íon
metálico Sn²+. Além disso, a sensibilidade dos mutantes sod1 e sod2
revelou a importância das enzimas antioxidantes Sod1p e Sod2p na
resposta aos danos gerados pelo íon metálico Sn²+. A sensibilidade mais
elevada ao SnCl2 foi observada quando as células estavam na fase
exponencial de crescimento (fase LOG), o que sugere que há dois sistemas
independentes (um mediado pela repressão/desrepressão catabólica, e
outro, pela ativação da transcrição de genes envolvidos nas vias de
defesa contra espécies reativas de oxigênio (EROs)), que atuam em
conjunto e contribuem para a resistência aos danos causados pelo íon
metálico Sn²+. Para determinar a concentração do íon metálico Sn²+
captada nas células da levedura S. cerevisiae e correlacioná-la com a
toxicidade desse íon metálico, foi determinado o conteúdo de metal
intracelular pelo método de Emissão de Raios-X Induzida por Partículas
Carregadas, ou Particle Induced XRay Emission (PIXE), desenvolvendo-se
um protocolo para as análises. Os resultados obtidos mostraram que a
linhagem diplóide XS2316 captou 60% da quantidade total do íon metálico
Sn²+, captada pela linhagem haplóide XV184-14c. Isso indica que a
linhagem haplóide capta maior quantidade do íon metálico Sn²+ do que a
linhagem diplóide, o que pode explicar a citotoxicidade diferenciada de
ambas as linhagens quando tratadas com SnCl2. Por fim, utilizando-se a
mesma metodologia, foi realizada uma análise multielementar para avaliar
se havia uma interação entre o íon metálico Sn²+ e outros elementos
químicos essenciais para a célula. De acordo com as análises por PIXE,
após tratamento com SnCl2, a linhagem haplóide XV185-14c apresentou um
decréscimo significativo nas quantidades de Mg, Zn, S e Fe, e, por outro
lado, um aumento na quantidade de P. Para verificar como o íon metálico
Sn²+ é captado, distribuído e destoxificado, foram associadas técnicas
moleculares, incluindo ensaios de citotoxicidade e RT-PCR quantitativo
(qRT-PCR), com a metodologia do PIXE. Os ensaios de sobrevivência
mostraram que Fet4 e Zrt2, ambas proteínas de transporte de baixa
afinidade do ferro e zinco, respectivamente, podem internalizar o íon
metálico Sn²+. Por sua vez, qRT-PCR mostrou um aumento da expressão
gênica de CCH1 e MID1, os quais codificam as proteínas Cch1 e Mid1,
envolvidas no transporte de Ca²+ na membrana plasmática, sugerindo que
essas duas proteínas também podem estar envolvidas na captação do íon
metálico Sn²+. Os resultados indicaram que, uma vez dentro da célula, o
íon metálico Sn²+ pode ser armazenado no vacúolo através da ação da
proteína P-type ATPase Pmc1 e quelado no citoplasma pela metalotioneína
Crs5. Alternativamente, o íon metálico Sn²+ pode gerar EROs, em especial
o ânion superóxido (O2 -), o qual pode ser dismutado pela proteína
Sod1, formando peróxido de hidrogênio (H2O2) e radical hidroxil (.OH).
Consequentemente, as EROs podem induzir a transcrição de vários genes
envolvidos na resposta ao estresse oxidativo, como SOD1, YAP1 e APN1.
Para elucidar os mecanismos moleculares envolvidos na genotoxicidade do
íon metálico Sn²+, foi avaliada a indução de quebras causadas pelo SnCl2
na presença de formamidopirimidina (FPG) e endonuclease III (ENDO III),
bem como a interferência desse íon na reparação das lesões induzidas
pelo agente alquilante metilmetanosulfonato (MMS) em células de pulmão
de hamster chinês (V79) pelo ensaio cometa. Os resultados mostraram que,
em concentrações tóxicas, o íon metálico Sn²+ induziu somente uma
limitada elevação nos sítios sensíveis de FPG e ENDO III, sugerindo que o
íon metálico Sn²+ preferencialmente não induz lesões oxidativas nas
bases nitrogenadas. Embora a concentração de 50 μM de SnCl2 não tenha
produzido um aumento significativo na quantidade de danos ao DNA, ela
foi capaz de inibir a reparação dos danos provocados pelo agente
alquilante metilmetanosulfonato (MMS) durante o período de
pós-tratamento de 24h. Os resultados demonstraram o efeito genotóxico e
comutagênico do SnCl2 em células V79. O efeito inibitório do íon
metálico Sn²+ na reparação dos danos induzidos pelo MMS no DNA sugeriu
que esse metal também pode interferir em sistemas de reparação do DNA,
que contribuem para o aumento de mutações pela alteração do equilíbrio
entre o processo de reparação livre de erro e o sujeito a erro.
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